MEMÓRIA

A HISTÓRICA GREVE DE 1953.

Artigo publicado na edição número 36, junho de 2013. Para ler é só clicar na imagem.

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O Blog da Revista UNIFICAR pretende resgatar também a MEMÓRIA da Marinha Mercante e dos mercantes. Para abrir a série o artigo “O Balaio de Caranguejos”, publicado em 1979, no boletim do antigo sindicato de Náutica, editado por Romulo Augustus Pereira de Souza, autor do livro "Memórias de um pelego". Nos antigos boletins havia sempre um artigo de fundo, espécie de editorial, com as posições do órgão de classe em relação a determinados problemas. Denominava-se “A Nossa opinião”.

Antes, um esclarecimento de Romulo Augustus:

"O país que não conhece a sua história, está condenado a repeti-la”.

Tal aforismo não se aplica apenas às nações. Ocorre também no dia-a-dia do sindicalismo marítimo, ao defrontar antigos problemas disfarçados com novas roupagens. Como se vê da leitura de editorial publicado num boletim sindical dos anos 70, em plena ditadura militar. Primeiro da série que se pretende republicar, diz respeito a problema então atribuído ao arbítrio de regime de exceção. O tom panfletário do artigo dá ideia da gravidade do problema. Todavia, a greve pelo acesso aos portos não encontrou então o necessário respaldo das bases e da maioria dos demais sindicatos.

Ficaram o documento e o problema.

Boletim nº. 143 de 06/08/1979

"O BALAIO DE CARANGUEJOS"

“Pretendem perseguir a mulher de um pobre marinheiro por trazer um vestido de chita da Índia que lhe deu o marido. Os homens daqui recebem salários modestos. Se continuarem a agir assim para com eles e para com as suas respectivas famílias, daqui a dez anos não haverá marinheiros”.
Tais palavras foram ditas no ano da graça de 1668 pelo presidente da Câmara de Saint Malo, na França.
Poderíamos enviá-las por telex ao Presidente da República e assinar em baixo. E ainda estaríamos aquém da nossa realidade atual.
Que é a seguinte:
Nossos portos são hoje autênticos campos de concentração, onde desaguam as incompetências e apetites de moluscos segregadores de papelório, servidos por achacadores, à custa da nossa dignidade profissional e, sobretudo, humana.
Através das manchetes dos jornais intima-se o governo a anistiar até profissionais do terror. E isso certamente será feito.
Mas nós, marítimos, que sequer pertencemos à humana espécie, que não temos família e, na opinião de muitos – nem mãe -, a quem recorremos ou o que fazemos?
Quando alfândega e legislação fiscal protegem a grande pilhagem organizada das multinacionais, mas nos encaram como perigosos marginais, a julgar pelas buscas e apreensão de objetos de uso pessoal. Além dos depósitos compulsórios que cobram do cidadão.
Esses males vêm da área econômica – do Ministério da Fazenda.
Quando guardas portuários bossais e despreparados, comandados por militares de pijama, exercitam técnicas nazistas de campos de concentração sobre quem trabalha e dá vida aos portos, ao mesmo tempo em que se verifica a entrada de bandidos, maloqueiros, traficantes e proxenetas. Estes sim, organizados para tratar com tais “autoridades”.
Que são subordinadas às administrações dos portos e à Portobras – agora no âmbito do Ministério dos Transportes.
Quando o crime organizado fatura bilhões de dólares e os tóxicos atingem as nossas escolas primárias, uma Polícia Federal se ocupa em impedir o ingresso de familiares a bordo e revista bolsas com roupa suja – por vezes o único “presente” que temos condição de levar para casa. Sem falar das longas esperas ao largo pela visita.
Essa polícia pertence ao Ministério da Justiça.
E as capitanias, enquanto fiscais do trabalho marítimo, têm por obrigação facilitar nosso acesso aos locais de trabalho, inclusive punindo quem isso obstar. Deveriam, no mínimo, determinar a abertura dos portões e guaritas, evitando o sacrifício das longas caminhadas. Também nada fazem em benefício do pessoal mercante.
Nisso, subordinadas ao Ministério do Trabalho.
E como militares, garantir aquilo que realmente represente a segurança nacional de que são tão zelosos. Que é o Poder Marítimo, do qual é parte proeminente a marinha mercante. Aliás, reserva naval da Armada.
Aqui a competência é do Ministério da Marinha.
Eis aí, companheiros, em rápidas pinceladas, esse estranho “balaio de caranguejos” onde não se sabe onde nem quando começam e terminam as competências.
Todos são testemunhas dos esforços do Sindicato para abrir uma brecha nesses autênticos muros da vergonha, que são os nossos portos. E da paciência bovina que temos tidos nós, os oficiais de náutica, para com as agressões diárias e desmandos que nos chegam ao conhecimento.
Estamos decididos a levar o caso, em conjunto com os demais órgãos de classe, ao próprio Presidente da República.
Mas, se ainda uma vez, nada resultar, no sentido de acabar com essa pouca-vergonha - a falta de termo que melhor exprima o absurdo:
Então a solução, se outra não nos deixarem -, é a GREVE!
Greve contra esses gusanos insensíveis. Vamos derrubar esse muro de Berlim que não tem razão de ser e que bem sabemos – nós que viajamos –, só existe no Brasil.
Se com a greve fizermos chegar à opinião pública essa verdadeira desgraça que assola o marítimo e demais trabalhadores, prisioneiros sem culpa nem crime;
Se com ela mostrarmos a essa corja, quem são eles e quem somos nós;
Teremos feito a nossa parte.
Eles que paguem para ver.
ESTE É O NOSSO PONTO DE VISTA"